quarta-feira, junho 11, 2008

Os indignados


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Isto é um bocadinho como o futebol. Gera-se a dinâmica do conflito, cria-se as condições para a desordem e para a impunidade sempre que as coisas não correm ao gosto da grei. No futebol, porque um árbitro de mãe mal comportada marcou um penalti contra as nossas cores. Nos transportes rodoviários porque os combustíveis começam a ter um preço incomportável para se obter lucros, ainda que ninguém me tenha explicado o que impede os camionistas de aumentar os preços dos fretes. Mas voltando ao conflito, penso que estamos mais perante um problema de desordem pública do que propriamente de reivindicação. A tal dinâmica do futebol instalou-se e se há coisa que os portugueses gostam (e não sabem fazer civilizadamente) é recalcitrar.

Pacheco Pereira diz no Abrupto que «…está toda a gente a fazer de conta, a começar pelo governo, que não existe hoje um grave problema de ordem pública em Portugal. Tudo na paralisação das empresas de camionagem é ilegal e ninguém quer saber. Impedir a circulação e “bloquear estradas é ilegal, organizar piquetes que impedem com violência os camiões de passar é ilegal, e tudo isto é feito diante dos olhos dos agentes da GNR que passivamente assistem não se sabe bem para quê…» . Pela minha parte acho que há um pormenor que provavelmente se encontra já esbatido na memória das pessoas. É que o Partido Socialista tem uma responsabilidade maior na contribuição objectiva que teve para o actual estado de coisas. Muito antes do desvario de Armando Vara na Ponte e dos idiotas úteis que o seguiram, já Soares e Sampaio haviam dado sinais lamentáveis de reviralho em regime contínuo, mesmo quando já não havia nada para revirar. E se bem nos lembramos foi a autoridade, a PSP e a GNR, a ser achincalhada por dois presidentes que se divertiram imenso com as diatribes a que se entregaram na altura, no total desrespeito pela ordem pública e, afinal, numa atitude não muito diferente da do Bloco de Esquerda quando se empenha a ensinar aos jovens a desobediência civil. Estes episódios de Soares e Sampaio foram duas gotas no oceano de contestação em que o PS se banhou e, ainda, por cima, pensando que estava a fazer uma linda e pedagógica figura. Foi pena que não tivessem provado, à altura, do direito à indignação que Soares também pregou e o povo indignado não corresse com eles. Mas contaram com uma massa lêveda e bovina pastoreada por um séquito de boys profissionais e tudo acabou por afunilar no actual clima de agitação social que se vive.

Por mim diria que é bem feito para o PS. O problema é que os efeitos do actual estado de coisas não tem a ver com o PS. Tem a ver com todos nós e as consequências estão aí à vista. Espera-se agora mais cedências de Sócrates, tal como já aconteceu com os professores, os pescadores, “utentes” (ai, os utentes…) dos postos de saúde, autarcas e outros que estarão aí ao virar da esquina, a seguir aos camionistas.

Que S. Cristóvão nos valha.

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