terça-feira, novembro 15, 2016

A sorte que os pais tinham, quando eu tinha sete anos



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Um dia o meu pai sentou-me na caruma de um pinhal que havia entre a Encarnação e o Aeroporto, hoje transformado em saída da 2ª Circular para a A1. Era Domingo e ele costumava levar-me a mim e aos meus irmãos àquele pinhal onde passámos muitos Domingos saudáveis.

Lembro-me que nesse dia estava uma Lua cheia enorme e bem visível, apesar de ser dia. Eu teria os meus sete anos e o meu pai, que do mais trivial facto fazia uma espécie de conto de encantar, explicou-me o que era a Lua. Porque é que ela ali estava. Porque que é cerca de uma hora depois já não estava no mesmo sítio. Deu-me uma noção dos movimentos de rotação e translação, sem precisar de usar estes palavrões. Disse-me que na Lua não havia ar (recordo que esta foi uma passagem da história que me fez confusão, não havia ar? Mas como é que podia?) e portanto não se podia viver lá. E continuou explicando mais coisas. Em linguagem simples falou-me das marés, uma coisa que já me havia feito confusão na praia do Guincho porque umas vezes via-se aquelas rochas que hoje ainda lá estão e outras não se via e ele explicou-me. Não precisou de falar de Newton, da maçã nem do palavrão gravidade, mas conseguiu explicar-me o fenómeno e eu lembro-me que percebi.

O meu pai era assim. Repito que ele tinha o condão de fazer uma história de encantar de qualquer facto trivial. E desde esse dia em que ele me falou da Lua acho que fiquei a perceber razoavelmente o que era, porque a víamos e porque é que as rochas da praia do Guincho apareciam e desapareciam.

O meu pai tinha muito jeito, eu sei, Mas, aqui para nós, ele tinha a grande vantagem de nessa altura não haver psicólogos que exortavam os pais a explicar às criancinhas porque é que Trump ganhava eleições. Havia coisas bem mais interessantes para explicar aos filhos. E mais úteis. Tanto que em 1969, ia eu a caminho do Bailundo (uma terra angolana que alguns conhecem) visitar uns amigos e ouvi na rádio que um astronauta acabara de chegar à Lua. Lembro-me bem, era um jovem, talvez tivesse ainda fresca a história que o meu pai me contara no pinhal da Encarnação. E ao ouvir a notícia lembrei-me da história. E ontem, ao ver a Super Lua lembrei-me muito do meu pai.


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2 Comments:

At 9:25 da tarde, Blogger Fernando Tavares disse...

Simplesmente EXCELENTE!
ftavares

 
At 4:36 da tarde, Blogger estouparaaquivirada disse...

Olá Nelson,
Adorei a história.
bjs

 

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